A Crise do consumo de Luxo é por Pertencimento
Pois passamos do materialismo para o "hiperluxo experiencial", sabia?
Pois é, a Milan Design Week trouxe à superfície algo que os pesquisadores do setor do luxo já estavam nos sinalizando há tempos: a essência do luxo não está mais em vender produtos. Trata-se de conduzir as pessoas a uma jornada emocional capaz de transformar sua experiência, hipnotizá-las sensorialmente e criar memórias positivas duradouras.
E este post trata exatamente disso: a virada de chave no entendimento do que é luxo hoje. Não é sobre o objeto em si, mas sobre aquilo que ele desperta — uma experiência que conecta o indivíduo a algo mais profundo, mais humano, mais atemporal.
Mas por que cheguei a essa percepção? Bem, na nossa análise da Milan Design Week (acesse aqui) — e depois de percorrer feiras, instalações e eventos paralelos que moldam as tendências globais de interior design e lifestyle — ficou evidente: não basta mais criar tendências estéticas.
O que realmente se destacou foi a busca visceral por significado, tempo qualitativo e pertencimento.
Foi a sensação de que, em meio a tanta inovação, tecnologia e estética, o que verdadeiramente tocava as pessoas era a experiência sensorial e emocional que o design, a arquitetura e o luxo eram capazes de oferecer.
Em outras palavras: o futuro do design, do luxo e da criatividade não está em "lançar novidades" e sim está em criar vínculos, gerar memória afetiva e restaurar a conexão entre as pessoas e o que elas escolhem viver.
O luxo contemporâneo exige mais de nós: pede coragem para desapegar de velhas fórmulas, sensibilidade para ouvir o que o mundo silenciosamente clama, e inteligência para desenhar experiências que sejam mais do que bonitas — que sejam memoráveis, regenerativas e verdadeiramente humanas.
É sobre isso que vamos falar agora. Pronta?
Como reescrever o significado de valor, inovação e desejo no nosso trabalho criativo?
E tudo estava ok enquanto, antes da pandemia, o luxo vendia apenas status, exclusividade e materiais nobres mas agora, quase que magicamente, essas promessas já não encantam tanto os novos consumidores — pense nas gerações Y, Z e até nos novos boomers mais conscientes.
Um levantamento da Deloitte com 15.000 consumidores em 2023 revelou que 78% dos consumidores de luxo da Geração Z valorizam mais a experiência personalizada do que o produto em si, contra apenas 34% dos Baby Boomers.
O resultado? As marcas de luxo se veem diante de um desafio urgente: redefinir o que realmente entregam de valor porque hoje, preço alto, grife famosa e ostentação já não bastam mais.
Um estudo da Harvard Business Review analisou 64 marcas de luxo globais e descobriu que aquelas com narrativas autênticas e emocionalmente ressonantes superaram financeiramente seus concorrentes em média 22% nos últimos três anos!
Essa mudança de cenário começou a ser claramente quantificada no ano passado, nos relatórios da Business of Fashion e da McKinsey que apontaram algumas causas possíveis para a esta nova crise no mercado de luxo:
Tarifas comerciais dos EUA
Lentidão na recuperação econômica da China
Pressões de custos sobre as empresas
E — talvez a mais intrigante — uma proposta de valor em deterioração pesando sobre o setor global de luxo.
Mas o que exatamente significa "proposta de valor em deterioração"?
Significa que aquilo que, até pouco tempo atrás, justificava o desejo e o preço dos produtos de luxo está perdendo força, credibilidade e apelo.
Mas nem todas as marcas estão preparadas para incorporar esse novo código!
Comecei a me interessar por isso ouvindo a voz de uma autoridade no tema: Daniel Langer, CEO da Équité Luxury Unfiltered, uma das maiores autoridades globais. Foi ouvindo uma palestra dele no ano passado que compreendi: o mundo do luxo está enfrentando uma transformação epocal.
E foi ali que percebi os primeiros sinais dessa mudança que vimos ecoar no Salone e no Fuorisalone este ano.
E trago a você abaixo alguns dos insights que tive que conectam a visão de Daniel Langer com as leituras dos relatórios de Luxury Institute, Future Laboratory, TrendWatching e McKinsey.
O Luxury Institute revelou em seu relatório de 2024 que 82% dos consumidores ultra-ricos estão dispostos a pagar até 40% a mais por experiências que criam memórias significativas em vez de produtos físicos de luxo.
Este é o novo mapa do luxo: uma travessia que sai da superfície do consumo para mergulhar nas profundezas do significado.
Criar para esse novo mundo é mais do que desenhar produtos ou ambientes — é arquitetar experiências emocionais e regenerativas, onde cada detalhe importa e onde o tempo se dilata, se impregna, se eterniza. Não é sobre falar alto: é sobre tocar fundo.
E é aqui que, mamma mia!... o mundo do luxo está caro, raro e muito procurado, e está passando por uma mudança tumultuada: sua previsão é de crescimento de apenas 1% a 3% entre 2024 e 2027.
"Agora é a hora de as marcas se redefinirem estrategicamente para restaurar a desejabilidade, a criatividade e a exclusividade — os pilares do luxo", disse Rahul Malik da Business of Fashion.
Segundo as análises consultadas, existem basicamente 4 tendências principais que estão redefinindo o luxo:
Mudança estética: Post-Covid, vimos uma transformação do estilo colorido e irreverente para o "quiet luxury" e isso beneficiou empresas focadas em peças atemporais e icônicas.
Estratégia de preços: O setor atingiu um teto de preços após uma década de aumentos constantes baseados em exclusividade e escassez, limitando crescimento futuro.
Experiência: Empresas com orçamento e visão para investir em ecossistemas de serviços e experiências envolventes estão prosperando, como vimos aqui no Salone e Fuorisalone este ano. As outras, che peccato, estão ficando para trás!
Embaixadores de marca: Hoje, vão além das estrelas de cinema, incluindo jogadores de futebol, atletas, gamers e outros influenciadores e marcas que se adaptaram a essa mudança estão ganhando mercado.
Enquanto isso, a base de clientes de luxo está se tornando mais diversificada, e os clientes têm uma relação mais complexa do que nunca com os produtos premium e aqui ter uma proposta de valor diferenciada é essencial nesse cenário de baixo crescimento.
Basicamente, hoje, um sofá caríssimo de uma marca famosa não é suficiente se ele não tiver sustentabilidade, autenticidade ou um storytelling regenerativo por trás.
Uma bolsa de €15.000 não gera mais desejo se for percebida apenas como "consumo inconsciente" ou "ostentação fútil" — especialmente num mundo que fala cada vez mais de responsabilidade ambiental, cultural e social.
Gilles Lipovetsky disse no "O Império do Efêmero" que o luxo contemporâneo está migrando do materialismo para o "hiperluxo experiencial", onde o intangível supera o tangível em valor percebido.
E eccoci com um ponto-chave para nós, designers e arquitetos: os clientes estão se interessando mais por EXPERIÊNCIAS de luxo, e não apenas por produtos! Isso é uma oportunidade incrível para quem trabalha com espaços e ambientes, não acha?
Mas o que vale hoje em termos de luxo contemporâneo?
Não é aquilo que se mede em milhões. O verdadeiro luxo agora habita no que não pode ser comprado: o tempo bem vivido, a autenticidade que não se fabrica, a beleza que nasce de um propósito maior.
O novo valor do luxo não está mais no que brilha para os outros, mas no que ressoa dentro de nós. E por isso, dentro destes novos cenários revelados, eu arriscaria numa nova proposta de valor construída sobre 5 pilares essenciais:
Tempo (feito para durar — longevidade)
Autenticidade (história verdadeira, não marketing vazio)
Sustentabilidade (ambiental e humana)
Regeneração (não basta "não poluir", é preciso melhorar o mundo)
Identidade e comunidade (as pessoas querem pertencimento, não status vazio)
Quem continuar vendendo o luxo só pelo "glamour ostentatório" vai perder relevância.
E para nós, profissionais de design e arquitetura, essas mudanças são desafios ou oportunidades?
A essência do luxo não está em vender produtos; trata-se de levar as pessoas a uma jornada emocional que transforme sua experiência, as hipnotize e crie memórias positivas duradouras como trago nestes 2 conhecidos cases da nossa área mundo afora:
Case Hermès La Maison Shanghai
A Hermès revolucionou o conceito de loja de luxo ao criar uma "casa" completa em Xangai, onde não há pressão para comprar e os visitantes são convidados a explorar quatro andares de experiências sensoriais, workshops artesanais e espaços contemplativos. Os produtos são apresentados como parte de um estilo de vida, não como itens de venda e o resultado è claro: um aumento de 72% no tempo de permanência e 34% mais conversões de novos clientes para a categoria de "clientes recorrentes".
Case B&B Italia com Piero Lissoni
A B&B Italia transformou seus showrooms em "laboratórios de vida", onde os móveis são apenas elementos de histórias mais amplas sobre como vivemos e nos conectamos e aqui em Milão, o espaço concebido por Lissoni conta "histórias de casa" em vez de mostrar produtos, resultando em um aumento de 41% nas vendas de coleções completas em vez de peças individuais.
Estes são apenas 2 cases… e vejo ainda 80% do mercado aqui na Itália com muitas marcas persistindo com histórias genéricas que não as diferenciam no mercado - o que chamo de "il nulla cosmico"…
E è por isso que, para navegar nessa crise, precisamos transformar nossa abordagem, investindo em narrativas inspiradoras e centradas no cliente, que se conectem profundamente com os valores e aspirações dos consumidores.
Mas então, o que um designer, arquiteto ou criativo pode realmente fazer?
Antes de mais nada, precisamos entender que a verdadeira inovação hoje não é sobre criar "o novo pelo novo". É sobre criar relevância. É sobre construir pontes emocionais.
Isso significa que um criativo deveria:
Reaprender a ouvir — os anseios não-ditos de uma geração que valoriza propósito, pertencimento e verdade.
Investir em narrativas profundas — histórias autênticas, que carreguem significado cultural e que sejam capazes de emocionar e de transformar a percepção do público sobre aquilo que ele consome e habita.
Redefinir a promessa do seu trabalho — mais do que beleza e função, aquilo que entregamos precisa responder à pergunta essencial: que tipo de transformação ou memória positiva estou oferecendo a quem se conecta com meu projeto?
Ser um editor de tempo e significado — selecionar o que é essencial, criar para durar, deixar de lado o excesso e a pressa.
Ser antes de se vender assim jà seria um bom começo…
E por fim, a gente sabe que engajar a Geração Z exige inovação e compreensão de suas altas expectativas de autenticidade e relevância cultural e então eu vejo que não se trata de uma campanha publicitária ou golpe de relações públicas, mas de definir claramente "o que realmente estamos vendendo" - ou seja, a promessa emocional fundamental.
Verdade por exemplo nunca falha… Essa anziana signora que nunca sai de moda, vero?
Ps.: Isso è o que eu penso agora, mas estou ainda digerindo. E você, o que acha?
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Un bacio, Fah